Por Pedro V Feu Rosa

Não faz muito tempo recordava uma entrevista feita com o sociólogo José de Souza Martins, da USP, que pesquisou cerca de 20 mil casos de linchamento no Brasil.

Naquela oportunidade ele declarou que “ocorrem, em média, quatro linchamentos por semana. E pode-se dizer que pelo menos 500 mil pessoas já participaram de linchamentos no País nos últimos 50 anos”.

Seria isso coisa do interior distante? Perguntado sobre as regiões nas quais os linchamentos são mais freqüentes o pesquisador foi seco e firme: “Na cidade de São Paulo, seguida por Salvador e pelo Rio de Janeiro. Aqui no Brasil o linchamento é urbano, ocorre normalmente nas periferias das grandes cidades”.

O repórter perguntou em seguida se a pesquisa detectou alguma condenação por linchamento. Eis a chocante resposta: “Que eu tenha conhecimento apenas um, em Santa Catarina. A vítima sobreviveu ao ataque por algumas semanas e reconheceu 23 pessoas. Apenas um foi condenado, o mais pobre”.

Qual seria o motivo de tamanha impunidade? A resposta: “Como o linchamento é um crime autodefensivo as elites não vão considerar criminoso aquele que o pratica. Pesquisas indicam que 50% da população brasileira são favoráveis ao linchamento. Não somos um povo cordial, somos muito violentos”.

Você sabe qual a origem do termo “linchamento”? Existem duas versões. Segundo uma delas ele teria vindo de um lugar conhecido como Lynch Creek, nos EUA, onde, durante os idos de 1768, eram julgados e executados sumariamente os suspeitos.

A outra versão, mais aceita, atribui a origem do termo a um juiz norte-americano de nome Charles Lynch, o qual, nos idos de 1780, teria se notabilizado por realizar julgamentos sumários em tribunais informais.

Deve ser registrado que estes “julgamentos de Lynch” foram tão aceitos pela população que uma Assembléia Geral do Estado de Virginia, realizada em 1782, os legalizou inclusive retroativamente!

Ouso dizer que nem em seus momentos de maior delírio o juiz Lynch imaginou que encontraria tantos adeptos e seguidores em um país como o Brasil, que tanto canta a virtude e a tolerância.

Pois é: talvez já tenha passado da hora de a nossa sociedade discutir, sem paixão e sem hipocrisia, os fundamentos de um país que dá exagerados direitos de defesa a alguns réus para depois matá-los pelas ruas.


  • Pedro Valls Feu Rosa é jornalista, escritor e desembargador no ES. E escreve regularmente para a AGENCIA CONGRESSO.