EUA – Cidades inteiras poderão desaparecer do mapa no futuro. A falta de prevenção dos governos em relação às mudanças climáticas é grave, afirma o historiador americano Joel Mokyr. Para ele, hoje a sociedade tem mais condições para enfrentar pandemias.
“A humanidade tem hoje ferramentas que há 100 anos, quando emergiu a gripe espanhola, nem sequer poderiam ser imaginadas. Em 1918, as pessoas não sabiam que a gripe espanhola era causada por um vírus, que foi isolado apenas em 1933. Já o sequenciamento genético do coronavírus foi feito em semanas, em meio a uma crise sanitária que surgiu há seis meses. A gripe espanhola matou 50 milhões de pessoas no mundo”, afirma.
Em quais situações os governos deveriam ser mais atuantes?
Um assunto urgente é a questão das mudanças climáticas. Sem a intervenção dos governos, esse será de longe um desastre muito maior do que a pandemia de covid-19 terá sido. A diferença é o tempo do impacto. Os efeitos das mudanças climáticas levam anos para se manifestar. É apavorante o que pode acontecer e ninguém está fazendo nada a esse respeito. Já sabemos o que precisa ser feito e também como fazer, mas isso demanda recursos que os governos só passam a gastar se outros governos também estiverem desembolsando. E, ainda assim, os recursos não serão suficientes. O mundo atingiu uma sofisticação tecnológica capaz de solucionar muitos dos nossos problemas, porém seguimos tendo líderes idiotas. A prosperidade econômica exige um alto grau de liberdade, inconformismo e gente pensando fora da caixa.
AMEAÇA A DEMOCRACIA
“Nos últimos 20 anos houve um declínio acentuado na prevalência e na popularidade das democracias liberais. Isso faz parte de um “ciclo normal”. As democracias liberais são processos confusos e difíceis de manejar, geralmente repletos de corrupção”.
“Então, as pessoas se cansam delas e escolhem populistas autoritários ou machos “lei e ordem”, como Rodrigo Duterte, nas Filipinas, e Hugo Chávez, na Venezuela, somente para descobrir que são dez vezes piores, e depois querem os democratas de volta.”
Por que isso ocorre?
O problema é que existe uma assimetria: é fácil votar em líderes democráticos inaptos ou desonestos — essa, afinal, é a ideia por trás da democracia. Mas os autoritários, em geral, exigem muito mais esforço para ser desalojados: veja o horrível Viktor Orbán, na Hungria, para não falar de Vladimir Putin, na Rússia, e Xi Jinping, na China. Foi preciso uma guerra para livrar o mundo de Mussolini e uma espera de 30 anos para fazer o mesmo com Franco, na Espanha. Eles compartilham entre si uma visão anti-intelectual e anticiência, sem compromisso com valores como a liberdade de expressão. Eles não são conservadores, mas criam uma mistura tóxica de ideologia nacionalista reacionária, criptofascista e raivosa.
O presidente Bolsonaro já se envolveu em muitas polêmicas desde que foi eleito e agora tem minimizado os impactos da pandemia no Brasil. Como o senhor avalia?
Bolsonaro representa uma tendência global em direção ao declínio da qualidade institucional e à corrupção da governança básica. O que a história nos conta é que, ao contrário da tecnologia que sempre melhora, isso não se aplica aos governos, que ora avançam, ora retrocedem. Mas a diferença entre esses novos líderes populistas está nas restrições institucionais que enfrentam: Duterte e Putin podem se safar de assassinatos, Xi é ainda pior, Trump não pode fazer da maneira que ele gostaria. Vamos torcer para que Bolsonaro acabe mais como Trump e menos como Putin. Mas não invejo os brasileiros.
(EXTRAÍDO DA ENTREVISTA A REVISTA EXAME)