Por Luiz Trevisan
O jornalismo político e a liberdade de imprensa estão em alta nas telas dos cinemas. Já longe das telas, o roteiro é diferente. “The Post”, que esmiúça reportagens desnudando mentiras do governo americano sobre a Guerra do Vietnã, é a fita mais recente.
Segue na trilha do Spotlight – casos de pedofilia, divulgados em 2001, revelados por jornalistas e que abalaram a Igreja Católica. Levou Oscar de melhor filme. E há outro não menos famoso, “Todos os Homens do Presidente”, que provocou a renúncia do já abalado presidente Nixon, isso em 1972.
Mostram a política pelas lentes do cinema, a partir de casos de sucesso do jornalismo, às vezes com certo glamour que valorizam a profissão. Volta e meia Hollywood flerta com esse tema: jornalistas enfiados em averiguações de abalar o coreto e metrópole.
Em “Cidadão Kane”, de 1941, Orson Welles trata dos interesses nem sempre explícitos das corporações de comunicação embutidos numa narrativa sobre ascensão de um mito da imprensa americana.
Até hoje é considerado um dos melhores filmes de todos os tempos, não apenas pela história, mas também devido ao surpreendente roteiro e edição.
E há um faroeste de John Ford, de 1961, abordando, quem diria, fake news nos tempos do onça e que ajudaram a eleger um senador. O nome dessa fita, “O Homem que Matou o Facínora”, já antecipa o enredo: advogado da cidade grande chega à cidadezinha sem lei, entra em conflito com o bandidão da área.
E com a ajuda secreta de um pistoleiro local, dá cabo do valentão. Vira “o cara”, é eleito senador. Anos mais tarde, ele revela a um jornalista a verdade dos fatos. O jornalista prefere ignorar, e devolve uma pérola: “Quando a lenda supera os fatos, imprima-se a lenda”.
Hoje, fake news pululam nas redes sociais e, paradoxalmente, isso alimenta a mídia tradicional, na medida em que essa mídia passa confiabilidade. Nas redes e em certos veículos de plataforma digital ainda não há condições nem corretivo hábil contra notícias falsas.
Já nas redações tradicionais, com ou sem crise, só se veicula aquilo que é apurado e checado, questão até de sobrevivência num mercado em ampla transformação tecnológica e de conceitos, e cada vez mais competitivo.
No ano passado, a maioria dos médios e grandes jornais brasileiros, seguindo tendência mundial, registrou retração de publicidade, mercado e circulação. Teve jornal que declinou 28% no IVC. Outros diminuíram 10%, 14%, 20% ou mais.
Raríssimos apresentaram crescimento. Na medida em que a mídia digital expande, os anunciantes do impresso começam a migrar para esta plataforma, porém é algo moroso e cauteloso. Trata-se de um mundo novo que impõe cultura diferente, o pisar em ovos. Um recurso que alguns jornais lançaram mão foi aumentar o preço da edição, para ajudar a cobrir custos. Em muitos casos, isso reduziu ainda mais a vendagem.
Quais são os caminhos, a curto e médio prazo? Uma ala projeta que o jornalismo impresso só irá sobreviver se mostrar um produto diferenciado, pois não dá para competir, por exemplo, na cobertura factual – acidentes, ocorrências etc. – com a mídia digital, bem mais ágil.
Então, como inspiração, talvez seja o caso de olhar as grandes reportagens que viraram filmes. Bom, mas quem vai comprar isso numa sociedade saturada de informações, cansada de corrupção, crimes hediondos, alta impunidade, mutações de gênero, alarmante exclusão social, e castas privilegiadas que se comportam como vivessem em outro planeta? Dá debate pra virar dias e noites.
Recentemente, ao dar entrevista a um jornalista brasileiro para falar do seu novo filme, o ator e diretor Clint Eastwood, 87 anos, abriu lentes para o tema. Ao perceber o repórter com vários jornais impressos, Clint, constata: “Curioso, você ainda lê jornais em papel”.
Já no final do filme The Post, ambientado em 1971, a dona do Washington Post e seu chefe de redação observam que “jornalismo é o rascunho da História”, e que nunca se deve perder de vista, qualquer que seja a situação, que o jornalismo deve servir aos governados, e não aos governantes.
Pois é justamente este o outro grande desafio atual de muitos veículos. Num momento de crise econômica, redução de pessoal, contenção de despesas e mercado volátil, o governo costuma ser visto e aceito como a tábua de salvação possível.