Por Pedro Valls Feu Rosa

Um dia alguém falou que é chique andar por aí de paletó, não importando o fato de estarmos em um país tropical. Acrescentou-se a este ilógico vestuário um pedaço de pano em torno do pescoço, aumentando o desconforto naqueles dias de forte calor. Não, não importam o suor e o cansaço por ele provocado – o que vale é seguir os códigos de conduta e ficar elegante, seja lá o que for isso.

Valho-me deste prosaico exemplo para demonstrar que quase sempre a adoção pura e simples de modelos e conceitos válidos para países outros mostra-se inadequada para o Brasil, por não contemplar suas peculiaridades.

Eis aí algo lógico: cada povo foi forjado por eventos históricos únicos. Tem personalidade distinta. Vive sob uma realidade própria. Daí saltar aos olhos o quão pouco produtiva tende a ser a importação de “fórmulas prontas”.

É quando chego ao nosso “mundo das leis”. Muito dele – arrisco dizer que sua parte mais importante – importamos de países outros sem procedermos às devidas adaptações. Tem dado certo?

Temos um sistema processual quase que inteiramente baseado em burocracia – seja física ou digital. Faz sentido tal estado de coisas em um país tão carente de recursos? Por qual motivo prestamos tão poucas homenagens à oralidade?

Nosso Poder Judiciário funciona, na base, sob a figura de um juiz singular alocado em divisões administrativas rígidas. Há alguma inteligência nisto diante da evidente escassez de profissionais? Ou mesmo diante da infinidade de problemas que esta estrutura causa? Não seria mais ágil e barato o uso intenso e extenso de colegiados?

Nossas leis penais, fiéis às suas origens estrangeiras, pouco oferecem aos juízes no que toca ao tipo de pena a ser aplicada. Quando muito permitem alguma variação quanto à intensidade, e só. Engessam nossos julgadores, eis a verdade – e em sua esteira destroem vidas. Prejudicam o país tornando mais improvável a ressocialização. Este quadro é particularmente agudo em contraste com o estado de nossas masmorras, digo, prisões. Seria pedir demais que as penas pudessem ser de natureza minimamente compatível com a realidade?

O pior dessa situação é ela subsistir porque alguns poucos disseram que isso tem que ser assim mesmo e ponto final. Já não sabemos quem, quando e a partir de onde – mas e daí? Alguém falou, afinal.


Pedro Valls Feu Rosa é jornalista, escritor e desembargador no ES. E escreve regularmente para a AGENCIA CONGRESSO.