30-05-2014 - Cigarros apagados em copo descartável. 87% de fumantes Brasileiros se arrepende de ter começado a fumar. Foto: Rafael Neddermeyer/ Fotos Públicas

BRASÍLIA – As dívidas tributárias de empresas do setor de tabaco alcançam R$ 21 bilhões. De acordo com a PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional), 45 empresas têm pendências referentes a pagamento impostos com a União.

Enquanto os débitos somam cifras bilionárias, nos últimos 2 anos, o setor pagou R$ 14,7 milhões em impostos, segundo a Abifumo (Associação Brasileira da Indústria do Fumo).

De acordo com os dados da associação, a carga tributária do setor é, em média, de 73% (incluindo IPI, Pis/Cofins e ICMS).

Para atuarem no Brasil, as empresas da indústria do tabaco precisam de registro especial, uma espécie de autorização.

Pela legislação atual, a Receita Federal tem o poder de cassar esse documento se empresas que não pagam, intencionalmente, os impostos, os chamados “devedores contumazes”. A aplicação da punição obriga as empresas a fecharem as portas.

O poder do governo federal de tirar os registros das empresas do setor tabagista está nas mãos do STF (Supremo do Tribunal Federal).

A ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) foi protocolada pelo PTC (Partido Trabalhista Cristão) em 2007.

O Partido contesta lei e decreto da década de 1990. Os textos deram permissão para que a União casasse os registros especial no caso de não pagamento de tributos. Eis a íntegra.

O Partido alega que a norma viola os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e da presunção de inocência.

Para o PTC, a punição não é proporcional ao fim desejado, que é o pagamento dos débitos.

O julgamento da ação começou em 2010, com a leitura do voto do então ministro do STF e relator da ação, Joaquim Barbosa, que defendeu o estabelecimento de critérios para o cancelamento do registro.

Entre eles, a relevância do valor da dívida e o respeito ao direito da empresa se defender legalmente –o que foi garantido após uma mudança no decreto em 2001.

Durante o julgamento em 2010, a ministra Cármen Lúcia pediu mais tempo para analisar o assunto.

Para Edson Luiz Vismona, presidente do ETCO (Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial), há uma expectativa no setor pela decisão, pois afetará todo o mercado regulado. Segundo ele, a prática ilegal de não pagar impostos gera uma distorção no mercado.

Na prática, o devedor contumaz consegue vender o produto por um preço menor e manter a mesma margem de lucro de uma empresa que paga os tributos em dia.

Segundo Vismona, uma decisão favorável à Receita dará mais segurança para a atuação do Fisco para “combater essa prática ilegal e o rombo junto aos cofres públicos”.

LIMITES AO PODER DA RECEITA FEDERAL

Para o advogado especialista em direito administrativo Eric Hadmann, do escritório Gico, Hadmann & Dutra Advogados, do ponto de vista da Constituição, o decreto representa sanção política, e portanto, é inconstitucional.

“Não nego a necessidade de buscar o pagamento de débitos tributários, mas decretar administrativamente a exclusão de uma empresa de um mercado pode representar a sua sentença de morte”, afirmou.

Na avaliação de Hadmann, trata-se de uma discussão ampla, pois a decisão do STF sobre o assunto pode abrir precedentes. “A discussão é restrita ao mercado de tabaco, mas uma vez decidida pelo STF, nada impede que normas de outros setores da economia recebam o mesmo tratamento”, afirmou.

Hadmann defendeu outras formas de punições para empresas que deixam de pagar impostos, como aplicação de multas.

Segundo o advogado Luiz Rodrigues Wambier, sócio do escritório Wambier, Yamasaki, Bevervanço e Lobo Advogados, há uma linha de defesa para que a cassação só possa ser feita após uma decisão judicial, para não implicar em excesso de poder pela Receita.

Para Wambier, desde que respeitado o direito da empresa de se defender no âmbito administrativo, não é necessário que o caso seja julgado por 1 tribunal.

“Caminhamos para uma fase de desjudicialização, com mecanismos de mediação, negociação e meios adequados para resolução consensual de conflitos. Delegar toda decisão para o judiciário me parece demais”, defendeu.

DEVEDOR CONTUMAZ: PONTO ABERTO

Não há na legislação federal uma diferenciação clara sobre o conceito de devedor contumaz e o eventual, que deixa de pagar impostos por dificuldades financeiras momentâneas.

Para Wambier, dificilmente o Supremo conceituará a expressão durante o julgamento da ação. Na avaliação dele, o esclarecimento de uma definição evitaria eventuais discussões sobre o assunto na Justiça.

“Pode ser uma brecha para gerar mais discussões. Embora desejasse, acho pouco provável que definam, por exemplo, conceitos e prazos de inadimplência para ser considerado devedor contumaz”, explicou.

MERCADO BRASILEIRO DE CIGARROS

A comercialização de cigarros no Brasil possui diversas restrições por parte da Receita Federal, que também são aplicadas em outros setores como o de bebidas, o de biodiesel e o de papel imune.

Em 2017, foram produzidos 2,79 bilhões de maços de cigarros no Brasil. Segundo a Abifumo, um dos entraves a indústria brasileira é o mercado ilegal de cigarros, oriundos do Paraguai.

Em 2017, 222 milhões de maços contrabandeados foram apreendidos pela Receita Federal. Até junho de 2018, foram 130 milhões de maços.

O comércio ilegal também gera prejuízos aos cofres públicos, em decorrência da sonegação de impostos.

Com informações do Poder 360