A humanidade decidiu, há alguns anos, “virtualizar-se” – e este não foi um passo ruim. Esqueceu-se, porém, de que a acompanhar a evolução tecnológica há que estar a legal.
Ignorou a verdade simples de que ao mundo das leis não é dado ignorar o mundo real.
Foi assim que chegamos a uma estranha e ilógica época. Nela o crime não mais conhece fronteiras – virtualizou-se, afinal.
Nossas instituições, porém, em surpreendente contraste, continuam atadas à burocracia dos Estados, praticamente estáticas diante de um mundo dinâmico.
Pense nisso por um instante: nesta seara a cooperação internacional e mesmo interna é fundamental – e ela praticamente não existe!
Nossos mecanismos de defesa não dialogam entre si de forma eficiente – parece incrível, mas continuam presos ao papel! Não temos, ainda, enquanto raça humana, sequer um padrão legislativo a respeito do tema.
Movido pela curiosidade decidi futucar meu banco de dados. Cheguei ao dia 17 de outubro de 2000.
E li, no noticiário CNOL, as seguintes palavras: “Sem lei específica, Justiça vive impasse com crimes de informática”.
A matéria inclui a seguinte observação: “A frase dita pelo Deputado Federal Luiz Piauhylino (foto) resume a preocupação de grande parte do mercado de TI, do próprio Judiciário e do Governo com o avanço dos crimes cibernéticos no País”.
Voltei ainda mais no tempo. Cheguei a um debate publicado no “site” do Congresso Nacional aos 27 de março de 2000 sobre o tema.
Separei a seguinte frase: “O site do Supremo Tribunal Federal já foi invadido duas vezes este ano”. E estávamos ainda em março!
De lá para cá mais de duas décadas se passaram. Leio o sério jornal Valor Econômico e deparo-me com a seguinte manchete:
“Brasil conta com poucas armas legais para combater ataques de hackers” (edição do dia 09 de novembro de 2020).
Vou à janela. Contemplo instituições isoladas em um mundo globalizado. Vejo predominar pelos Estados a cultura do “não botar azeitona em empada alheia”.
Percebo não ter sido ainda superada a mentalidade dos “meus dados”, das “minhas informações”, da “minha jurisdição”, do “meu setor” e do “meu poder”.
Meditando sobre como vivemos menos e de forma pior por conta disso, fiquei a recordar Kaseff, segundo quem “os maiores inimigos declarados não fazem tanto mal quanto os pequenos e ocultos”.
Pedro Valls Feu Rosa é jornalista, escritor e desembargador no ES/Escreve
semanalmente para a AGC – Agência Congresso.
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