Dia desses li que cerca de cem milhões de brasileiros – quase metade da população deste tão rico país – não são atendidos por uma rede de esgotos.

Agora imagine que 40 milhões de compatriotas nossos não contam sequer com fornecimento de água.

Decidi debruçar-me sobre o problema. Descobri que mais de um terço de toda a água tratada perde-se pelo caminho, vítima no mais das vezes de sistemas carentes de investimentos.

Porém, mais há: em plena era da conscientização ecológica somente 46% do esgoto são objeto de tratamento – e apenas 22 municípios o tratam em mais de 80%.

Segundo consta este problema poderia ser resolvido até 2031 caso fossem investidos R$ 20 bilhões a cada ano.

Porém entre 2010 e 2015, por exemplo, o investimento médio foi de apenas R$ 11 bilhões por ano, um pouco mais da metade do que seria necessário.

É difícil entender um quadro desses: segundo cálculos realizados em 2013 pelo economista Célio Hiratuka, da IE-Unicamp, um investimento de R$ 1 bilhão em saneamento produz um aumento de R$ 1,7 bilhão no valor de produção da economia, uma expansão de R$ 245 milhões da massa salarial, de R$ 139 milhões em impostos diretos e indiretos e a geração de 42 mil novos empregos diretos e indiretos.

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Para completar tão cartesiano pensamento acrescento mais um dado: a cada R$ 1 investido em saneamento economiza-se R$ 4 no sistema de saúde. Eis aí uma conta absolutamente lógica e simples.

Acerca do tema a Organização Mundial da Saúde (OMS) nos ensina que “ambientes poluídos e insalubres matam 1,7 milhão de crianças por ano” por conta de “riscos ambientais, poluição do ar e da água, falta de saneamento básico e de infraestrutura adequada de higiene”.

Recorde-se, a propósito, que a taxa de mortes no Brasil é de 41,38 crianças com menos de 5 anos por 100 mil habitantes principalmente por conta de questões relacionadas ao saneamento básico.

Vou à janela. Contemplo o meu país. Fico a recordar as intermináveis discussões sobre as medidas de isolamento decorrentes da pandemia de 2020.

Muito falou-se da crise na saúde, mas bem pouco da sanitária. E são dois temas claramente entrelaçados, que deveriam comportar um olhar conjunto – antes que a próxima pandemia chegue.

Afinal, como isolar-se quem não tem esgoto e água? Ou manter-se em guetos quase metade da população?


Pedro Valls Feu Rosa é jornalista, escritor e desembargador no ES. Escreve semanalmente para a AGENCIA CONGRESSO.

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