BRASÍLIA – AGENCIA CONGRESSO – Nos idos da década de 1990, segundo li, o custo médio das drogas necessárias para o tratamento de doentes de AIDS situava-se em torno de US$ 12 mil ao ano por pessoa.

Eis que entrou em cena o saudoso presidente da África do Sul, Nelson Mandela, liderando um movimento pela quebra das patentes destes fármacos.

Noticiou-se, então, que a partir daí um fabricante de medicamentos genéricos da Índia lançou no mercado drogas custando menos de US$ 1 por dia.

Este debate – o da quebra de patentes em certos casos – é razoavelmente antigo. Engloba um argumento aparentemente sólido: o de que vacinas são fruto de pesquisas que custaram verdadeiras fortunas. O termo “aparentemente” não veio por acaso, conforme veremos.

Inicio por um estudo realizado sobre 210 medicamentos aprovados nos EUA entre 2010 e 2016, segundo o qual a maior parte dos recursos gastos em seu desenvolvimento veio de órgãos públicos.

Um outro levantamento, este mais recente, nos trouxe que os recursos públicos investidos na pesquisa de vacinas contra o COVID-19 alcançaram, em 2020, a espantosa soma de € 93 bilhões.

Sustentam alguns que a humanidade vive hoje em uma certa “aldeia global”. Convenhamos, porém, que esta aldeia é bem estranha: um doente europeu pode ser vacinado contra o COVID-19 por US$ 2,16 – e o mesmo fabricante vende a mesma vacina à Tailândia por US$ 5,25.

Há poucos dias li no conceituado jornal inglês “The Guardian” uma impressionante matéria segundo a qual o Brasil e a África do Sul estariam pagando a dado laboratório um valor duas vezes e meia maior que aqueles desembolsados pela União Europeia.

Aos valores: os europeus pagarão os já referidos US$ 2,16, enquanto brasileiros e sul-africanos US$ 5,25.

O diretor-geral da OMS tem sido enfático em afirmar que estamos, enquanto humanidade, à beira de uma ‘catástrofe moral’, dada a desigualdade na distribuição de vacinas. Fico a meditar: qual o exato alcance do termo “desigualdade”?

Fique claro – absolutamente claro, aliás – que os avanços científicos fruto do trabalho das empresas devem ser objeto de ampla recompensa. Sim, ampla – porém justa e ética. Afinal, tem gente morrendo.

Pois é. Uma pena que não fabriquemos, cá, nossas vacinas – temos optado pela realidade de sermos a “roça” desta “aldeia global”. Mas será que ela existe mesmo?


Pedro Valls Feu Rosa é jornalista, escritor e desembargador no ES. Escreve semanalmente para a AGENCIA CONGRESSO.